Entrevistadora: Edna G. Levy
E: Em nome da equipe editorial da revista online N’Areia, publicação oficial do IBTSandplay, gostaríamos de entrevistá-la para que você compartilhe sua rica experiência e conhecimentos em terapia de Sandplay com nossos leitores. Sabemos que sua trajetória e expertise na área são fonte de grande inspiração para muitos profissionais e estudantes que acompanham nosso conteúdo, e seria uma honra contar com sua participação em nossa revista.
E: Acreditamos que sua visão sobre a terapia de Sandplay, suas experiências e abordagens poderiam agregar imensamente aos profissionais, psicólogos ou médicos, interessados nessa prática terapêutica.
Como e quando foi o seu primeiro contato com o método Sandplay? Você optou por iniciar com o seu processo terapêutico em Sandplay ou pelo estudo do método?
Por volta de 1986, Elizabeth Zimmerman, recém-chegada da Suíça, foi a primeira pessoa a pronunciar a palavra mágica: “Você trabalha com Sandplay?” Eu não tinha ideia de que o Sandplay e a Psicologia Analítica eram tão semelhantes. Logo depois, fui procurar Fátima Gambini, uma das responsáveis pelo Método no Brasil. Logo, iniciei meu processo pessoal, pois precisava vivenciá-lo!
E: Como foi o seu treinamento formal e quem foram seus orientadores no seu treinamento?
Meu primeiro encontro verdadeiro com o Sandplay, como disse anteriormente foi com Fátima Gambini, com ela passei cinco anos em terapia. Mesmo já tendo passado por anos de análise o Sandplay trouxe a compreensão de muitos aspectos de minha alma.
E depois as Supervisões realizadas com Ruth Ammann em suas vindas ao Brasil, nas quais pude aprofundar ainda mais sobre o método e seu impacto no processo terapêutico.
E: Qual foi o impacto pessoal do Sandplay em você?
Eu não entendia muito bem o porque de sentir tanto entusiasmo quando entrei pela primeira vez na sala de Sandplay e me deparei com as miniaturas e a areia. Era um paradoxo, era tudo muito pequeno ao mesmo tempo muito grande. A delicadeza dos objetos me maravilhava, porém, a força deles me assustava. Descrevo esse impacto no livro que publiquei “Conversa com a Saudade”: tocar cristais contidos em uma caixa foi de grande impacto, eram minúsculos grãos de areia olhando para mim, como que dizendo: “Venha, vamos procurar.” Mas, procurar o quê? Novos caminhos, novas possibilidades? Não havia resposta, eram apenas reticências, era preciso ir de encontro, submergir naquela imensidão e se propor a descobertas.
Dizem que os cristais têm o poder de ampliar tudo. Acredito que sim, pois cada vez que me vejo em frente da caixa de areia, me sinto em frente ao universo e, à medida que vou tocando os cristais, percebo que as possibilidades são infindáveis.
Assim como constato que cada vez que entro em contato com uma imagem, tenho consciência da minha pequenez diante dessa imensidão.
E: Como você definiria o momento do seu despertar para o Sandplay? Você associa a algum símbolo específico?
Sim, bolas de Gude, logo me remeteram a fase em que iniciei minha primeira análise: outra fase da vida, quando desenhava bolinhas, uma atrás da outra, elas até pareciam colares. As imagens voltam, são como mitos que em determinada fase da vida reaparecem nos apontando novas direções.
A imagem do círculo lembra uma mandala, a forma que contém representações simbólicas do inconsciente, portanto essa ligação com o redondo reflete também uma busca do Si-mesmo, de um encontro maior. Simbolicamente, desenhar bolinhas seguidas, pode-se ver como a busca por um centro, a ideia de continuar, de não parar.
Aprender a enxergar as imagens com todas as funções que se apresentam, sentir, escutar, ver e saber aguardar a hora da revelação: este é o segredo do Sandplay.
Pensando nas partículas de Universo que ele contém, foi tocando-as, que vivenciei de maneira mais profunda o símbolo da transformação. Vivenciar o caleidoscópio me fazia perceber o que sentia internamente. A revolução interior mostrava-se na sequência de imagens que, mesmo sem me dar conta de imediato, me passava segurança, certeza no amanhã e a necessidade de viver o agora que, preconizava transformação.
E: Hoje, com toda experiência que você tem, você mudaria algum ponto da sua trajetória?
Não, acho que segui o caminho do coração.
E: você foi uma das primeiras Terapeutas de Sandplay reconhecidas no Brasil pela Sociedade internacional. Como você descreve o desenvolvimento do Sandplay no Brasil? Você acha que existem diferenças importantes entre os profissionais brasileiros e os do exterior? Tem algum aspecto que lhe cause preocupação?
A meu ver, estamos indo bem. No Brasil, para se formar em Sandplay, é necessário ser psicólogo ou médico, e acredito que estamos no caminho certo. Para compreender o outro, é fundamental primeiro adquirirmos um conhecimento profundo sobre nós mesmos, algo inerente à formação do psicólogo, para então buscar a especialização em Sandplay.
Me preocupa, no entanto, o entusiasmo de alguns profissionais em relação ao Sandplay e a formação informal que alguns deles recebem. O Sandplay é um recurso lúdico, mas está longe de ser uma simples brincadeira, pois se fundamenta em quatro pilares essenciais para a sua boa prática: processo terapêutico pessoal, conhecimento teórico em Psicologia Analítica e Sandplay, prática clínica e supervisão.
E:. Qual é o risco da formação informal para o profissional, assim como para seu paciente?
Pensando metaforiacamente, as escadas são fascinantes, mas podem se romper, ou atingir uma elevação tal, que impossibilite a descida, de ambos ou de um deles.
O Sandplay não é um brinquedo, é um instrumento de auto-conhecimento. Onde são tratadas nossas angústias, dúvidas, tristezas e alegrias. Dividir ou apresentar esses aspectos para alguém não habilitado, pode resultar em danos para ambos.
O Sandplay não é uma receita, que você erra joga tudo fora e começa novamente. Sandplay é um processo terapêutico que exige não só conhecimento teórico, mas também prático.
Lidamos com os mais profundos abismos da alma.
E: Se um profissional se interessasse pelo método Sandplay, como você o aconselharia: iniciar pelo seu processo terapêutico pessoal ou, pelos estudos do método?
Aconselho a fazer o processo pessoal e depois iniciar os estudos do método Sandplay.
E: Que “dica de ouro” você daria para os profissionais interessados em trabalhar com a terapia de Sandplay?
“ Não deixem para amanhã, comecem. ”
E: Gostaríamos que você deixasse uma mensagem para quem já é Terapeuta de Sandplay no Brasil.
Pessoal, ajudar o outro nos ensina também sobre nós e abre novos fronteiras tanto para o paciente como para o terapeuta.